20 de jan. de 2021

Se eu não me curar

Se eu não me curar não poderei amar.

Se eu não me curar não saberei como é viver sem me comparar ou ter ciúmes das coisas que não posso oferecer a que amo. E não saberei como é permitir que a liberdade, essa que eu valorizo tanto, possa ser compartilhada com outra pessoa.

Se eu não me curar não sentirei o prazer de ser quem sou nesse corpo. Se eu não me curar não serei capaz de confiar em mim, quem dirá no outro.

Se eu não me curar, ainda que eu transforme minha aparência e fique a cada dia mais próxima do meu próprio ideal de beleza, me sentirei quebrada por dentro e esperarei ansiosa que outra pessoa me ofereça algo que só eu posso me dar: a minha cura.

Se eu não me curar ficarei ansiosa, e por mais que eu medite a respeito disso e busque os porquês, eu me perguntarei sempre porque é que atraio sempre as mesmas experiências, os mesmos problemas, os mesmos dilemas. Se eu não me curar vou passar a vida toda repetindo os mesmos erros e reclamando dos defeitos das outras pessoas, que agora eu sei, apenas refletem os meus.

Talvez eu não possa remendar esses pedaços quebrados que a vida me deu de modo que não me reste ferida alguma, talvez a ferida seja por onde entre a compaixão pela ferida das outras pessoas. Mas se eu não me curar, não poderei ajudar ninguém, porque só posso ajudar até o ponto em que eu mesma caminhei com as minhas próprias pernas.

Se eu não me curar, talvez eu seja para sempre uma mulher meio criança, sonhando com alguém que me salve dos meus medos, dos pesadelos que tenho à noite, da solidão e do vazio que sinto mesmo quando estou me divertindo ao lado das pessoas que amo.

Se eu não me curar talvez eu passe a vida inteira procurando por alguém que realmente me escute e me entenda porque eu mesma não sou capaz de me dar essa compreensão em tempo integral. Talvez eu gaste todo o meu dinheiro buscando por formas de ficar mais bonita e talvez, se eu não me curar, a velhice chegue e eu tenha perdido toda a minha juventude correndo atrás de borboletas que viriam até mim se eu apenas me sentasse comigo mesma e apreciasse a vida da forma que eu sou hoje.

Se eu não me curar não poderei ser eu mesma, essa pessoa que acredita que o corpo é um reflexo da imagem que fazemos de nós mesmos em nosso mundo interior. Se eu não me curar não saberei apreciar a beleza das outras pessoas sem duvidar da minha. E minha vida será vazia, e não terá sentido dentro e fora de mim.

Se eu não me curar, fugirei de todas as coisas com as quais eu sonho simplesmente porque acreditarei que não as mereço e atrairei todas as experiências para comprovar a crença de que sou incapaz. Se eu não me amar haverá sempre uma tristeza atrás de mim me esperando pra me pegar na esquina dos momentos mais felizes.

Se eu não me curar, não serei capaz de amar estando nesse corpo. Amarei com a minha mente, com a minha imaginação, com os meus ideais e jamais poderei amar alguém de corpo e alma. Jamais aceitarei que o outro seja diferente de mim, jamais aprenderei como é enxergar a vida sobre outro olhar. E deixarei escapar entre os meus dedos as experiências mais fantásticas, aquelas que eu não quero ter pra que não acabem porque eu sei nada se repete, tudo tem um fim e eu não gosto de fingir que não tem. 

Se eu não me curar, não poderei morrer entre a verdade e o amor, essas coisas tão lindas através das quais eu vivo e acredito. Se eu não me curar, talvez a vida passe e eu tenha que repetir tudo de novo, e eu já me cansei.


Helen Negrão


Esse é o texto que escrevi para começar a nossa nova série de vídeos no Youtube sobre a cura das nossas 5 feridas emocionais, do livro "As cinco feridas emocionais", de Lisi Bourbeau.

Confira a série em: